* Madrugada

 

Ah! Este poema das madrugadas,
 
que há tanto tempo enrodilhado

num sem-fim de estados de alma
 
me obcecava, tirânico,
 
sem se deixar fixar! ...

 

Madrugada... e esta solidão crescendo,
 
esta nostalgia maior, e maior, e maior,
 
de não se sabe o quê

— nunca se sabe o quê...
 
que haverá nestas horas sozinhas e geladas,
 
para assim trazer à tona as indefinidas mágoas,
 
as saudades e as ânsias sem motivo

— de que não sabemos o motivo?...

 

Vieram as saudades do tempo de menino
 
— ou dum paraíso lá não sei onde?

Ah! que fantasmas pesaram sobre os ombros,
 
que sombras desceram sobre os olhos,
 
que tristeza maior fez maior o silêncio?

A que vem esse calor distante e absorto,
 
esse calar, esses modos distraídos?

Meu pobre sonhador! a esta hora

porventura se desvenda a Suprema Inutilidade?
 
e a definitiva ilusão de tantos gestos?


Interroga, interroga...

vai sonhando,

sem que saibas sequer o caminho que segues
 
vai, distraído e pensativo,
 
alheio de hoje,

vivendo já o derradeiro segundo...


Que a madrugada tem o pungir das agonias,

mas alheio, como o fim dum pesadelo...

 

Adolfo Casais Monteiro



12/02/2008
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